“Pela fé Abel ofereceu a Deus maior sacrifício do que Caim, pelo qual alcançou testemunho de que era justo... e depois de morto, ainda fala.” Heb 11;4
O que Abel fez por ter fé fala ainda conosco, muito tempo além da sua morte. Seu exemplo inspira-nos.
Pois, há uma fala mais profunda que as vozes banais; não se comunica com tímpanos e ouvidos; antes, com o entendimento, coração, a fé.
Desse calibre, a eloquente fala da Criação, a testificar sobre os atributos do Criador. “Porque suas (de Deus) coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto seu eterno poder, quanto, sua divindade, se entendem, claramente se vêem pelas coisas que estão criadas, para que eles (os ímpios) fiquem inescusáveis.” Rom 1;20
Ou, “Os céus declaram a glória de Deus, o firmamento anuncia a obra das suas mãos. Um dia faz declaração a outro, uma noite mostra sabedoria a outra. Não há linguagem nem fala, mas, se ouve sua voz. Sua linha se estende por toda a terra; suas palavras até ao fim do mundo...” Sal 19;1 a 4
Mas, voltando à “fala” de Abel, o que tinha de diferente da de Caim, que também ofertara e não fora aceito? Já ouvi muitos pregadores ensinarem que a oferta de Abel fora superior por ter trazido um sacrifício de animal, enquanto, Caim trouxera frutos da Terra. Aquele teria manifestado a necessidade de sangue Remidor, esse, descansado em certa soberba.
Sempre pareceu lógico isso, nunca incomodou; mas, pensando melhor, o que é maior, a oferta, ou, o “templo” que a santifica, como questionou O Salvador? O relato diz que, atentou O Senhor para Abel “e” sua oferta, porém, para Caim “e” sua oferta não atentou. Notemos que, o Senhor olhou primeiro para os “templos”, para sondar seus motivos, antes de olhar para as ofertas. Afinal, se a grandeza ou a qualidade da oferta contarem mais que o motivo, estaremos plasmando o feto da Teologia da Prosperidade no ventre do Éden.
Ademais, não havia ainda o ensino de que a vida estava no sangue, ou, instruções sobre sacrifícios aprazíveis ao Senhor. Então, atrevo-me a pensar que qualquer tipo de oferta seria aceita, se, feita com o sentimento e o motivo corretos; adoração, gratidão pelas bênçãos recebidas. Óbvio que um coração agradecido não traria coisas pífias.
A oferta de Abel teria vertido da sadia fonte, e a de seu irmão, mera emulação, competitividade. Tanto que, a reprimenda do Criador o exortou a fazer diferente para também ser aceito; não houve aceitação prévia de Abel e rejeição de Caim, antes, sondagem de ambos os corações e um apenas agradou. “O Senhor disse a Caim: Por que te iraste? Por que descaiu o teu semblante? Se, bem fizeres, não é certo que serás aceito?” Gên 4;6 e 7 Para a linguagem teológica temos um matiz de sinergismo desde o início.
O autor, depois do exemplo de Abel evocou toda uma plêiade de heróis da fé; num movimento ascendente, enfim, cravou o lábaro do argumento no topo do Everest, Cristo, Autor, e Consumador da fé. Da sua “Fala” naquela voz superior do exemplo, disse: “Chegastes ao monte Sião, e à cidade do Deus vivo, à Jerusalém celestial, aos muitos milhares de anjos; À universal assembléia e igreja dos primogênitos, que estão inscritos nos céus, e a Deus, Juiz de todos; aos espíritos dos justos aperfeiçoados; a Jesus, O Mediador de uma nova aliança, e ao sangue da aspersão, que fala melhor que o de Abel.” Heb 12;22 e 24
Agora sim, conta, a grandeza inefável da Oferta, entregou a si mesmo; e a excelência do motivo; amou pecadores. “Porque apenas alguém morrerá por um justo; pode ser que, pelo bom alguém ouse morrer. Mas, Deus prova Seu Amor para conosco, em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores.” Rom 5;7 e 8
Alguns imbecis e arrogantes dizem que a grandeza do Sacrifício mostra a grandeza do nosso valor. Não, essa “voz” fala do imenso amor de Deus, e da grandeza de nossa impureza que demandou tal Santidade para remissão.
Desse modo, dada a Majestade do que está em jogo, invés de nos perdermos devaneando arrogâncias deveríamos considerar a seriedade requerida. “Quebrantando alguém a lei de Moisés, morre sem misericórdia, só pela palavra de duas ou três testemunhas. De quanto maior castigo será julgado merecedor aquele que pisar o Filho de Deus, tiver por profano o sangue da aliança com que foi santificado, e fizer agravo ao Espírito da graça?” Heb 10;28 e 29
O inimigo enche o mundo de ímpias vozes para abafar “à Voz”; Roberto Carlos cantou: “Eles estão surdos;” todavia, o brado do Amor Divino ainda ecoa: “Quem tem ouvidos ouça...”
“E
quero, irmãos, que saibais que as coisas que me aconteceram
contribuíram para maior proveito do evangelho; de maneira que as minhas
prisões em Cristo foram manifestas por toda a guarda pretoriana, e por
todos os demais lugares; e muitos dos irmãos no Senhor, tomando ânimo
com as minhas prisões, ousam falar a palavra mais confiadamente, sem
temor.” Fp 1; 12 a 14
Ao
invés da comiseração Paulo comemora o proveito à obra derivado de seus
sofrimentos. O que tenho sofrido se tornou manifesto, e ao ver isso,
muitos irmãos, que estou disposto a sofrer pela causa de Cristo,
armaram-se de ousadia e estão inclinados a pagar o preço também; era a
ideia exposta.
Contudo,
como são raros em nossos dias homens que conseguem abstrair seu egoísmo
em favor de uma causa maior! Aliás, parece nem haver uma causa de maior
monta que as conquistas pessoais, a realização individual; ainda, entre
a maioria dos sedizentes cristãos.
Mesmo o Senhor tendo ensinado que o
maior entre os cristãos é quem mais serve, não conseguimos assimilar
isso ainda: não o anseio por grandeza, mas, o compromisso com o servir. “Porque todos buscam o que é seu, e não o que é de Cristo Jesus.” Fp 2; 21
Além
de fomentar a necessária têmpera ao que deve participar de um combate,
as lutas logram demonstrar profundidade, intensidade da fé. Tais
exemplos encorajam outros que de per si não ousariam tanto; mas,
estimulados pela valentia alheia, despertam à própria. Nesses casos,
raros, evidencia-se a conquista de Cristo; diverso dos “testemunhos de
fé” atuais cujas conquistas pessoais mensuram a fé.
A
carta aos Hebreus alista os grandes de Deus chamados heróis da fé;
depois de arrolar Abel, Enoque, Noé, os patriarcas, Moisés, os profetas…
seus sofrimentos por amor a Deus, o autor estimula os leitores a
verem-se como atletas num estádio cujo desempenho seria apreciado por
aqueles vencedores. “Portanto nós também, pois que estamos
rodeados de uma tão grande nuvem de testemunhas, deixemos todo o
embaraço, e o pecado que tão de perto nos rodeia, e corramos com
paciência a carreira que nos está proposta;” Como fazer feio por covardia em face a tantos valentes?
Por fim, o cotejo com o Exemplo do Sofredor Mor, posto que, inocente; “Olhando
para Jesus, autor e consumador da fé, o qual, pelo gozo que lhe estava
proposto, suportou a cruz, desprezando a afronta, e assentou-se à destra
do trono de Deus.” Heb 12; 2
Afinal, fé saudável não é um
atalho para evadir-se ao sofrimento; antes, uma viva convicção que
evita atalhos espúrios, mesmo ante o sofrimento. Com Jó foi assim: “Ainda que ele me mate, nele esperarei;…” Jó 13; 15
Assim,
não basta que creiamos que Deus pode algo para que o mesmo seja feito
em nosso favor; antes, devemos considerar a Vontade Soberana do Eterno.
Se essa for diversa de nossos anseios, ainda assim, permanecermos fiéis.
Como, aliás, se propuseram os três da fornalha em Babilônia. “Eis
que o nosso Deus, a quem nós servimos, é que nos pode livrar; ele nos
livrará da fornalha de fogo ardente, e da tua mão, ó rei. E, se não,
fica sabendo ó rei, que não serviremos a teus deuses nem adoraremos a
estátua de ouro que levantaste.” Dn 3; 17 e 18
O
Rei questionara quem poderia livrar aos judeus de sua mão; eles
responderam a isso fiados em Seu Deus; depois, expuseram sua fé: “… ele nos livrará…”
por fim, deixaram um senão, respeitando a possível vontade diversa do
Eterno, protestando que nem assim, abalaria sua fé.
O fim da história
conhecemos. Além do livramento dos que expuseram as vidas por amor a
Deus tivemos outro exemplo de coragem contagiante, de ousadia
mensageira.
Pois, mesmo o rei que quisera cultuar na marra seus ídolos
escreveu o que segue: “Por mim, pois, é feito um decreto, pelo
qual todo o povo, e nação e língua que disser blasfêmia contra o Deus de
Sadraque, Mesaque e Abednego, seja despedaçado, e as suas casas sejam
feitas um monturo; porquanto não há outro Deus que possa livrar como
este.” V 29
Entretanto,
sua ousada declaração foi muito pontual, ao sabor de um feito
extraordinário; adiante o encontramos de novo às voltas com seu maior
vício; o orgulho. Passou por uma dieta vegetariana de “sete tempos” para
cuidar disso.
A fé é mais sólida que frêmitos circunstanciais; esses podem ser filhos
do assombro, do medo. Aquela é dom de Deus; assombra-se mais com Seu
Ser, que com Seu agir.
E quando vemos um valente sofrendo sem desfalecer
temos alguém que “viu” a Deus; se algo de bom há em nossas profundezas,
pode emergir içado pelo anzol de tais exemplos.