quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Missão possível



“E, achando-o, lhe disseram: Todos te buscam. E ele lhes disse: Vamos às aldeias vizinhas, para que eu ali também pregue; porque para isso vim.” Mc 1; 37 e 38  

No  momento em que estava alta sua popularidade o Mestre costumava redirecionar seus passos; fama, pura e simples não era seu alvo. Havia feito curas, expulsado demônios, e por um instante afastou-se a orar. Quando o encontraram disseram: “Todos te buscam.”

Antes de se empolgar com a “alentadora” notícia manifestou outro desejo: “Vamos às aldeias vizinhas para que eu ali também pregue; porque para isso vim.”  

As questões mais comuns propostas pelos filósofos são: Quem somos? De onde viemos? Para onde vamos? Essas coisas que assombram pensadores modernos e fizeram o mesmo com antigos nunca foram problema para Ele. 

Sobre Seu Ser afirmou: “Eu sou a luz do mundo... o caminho, a verdade e a vida... Senhor e Mestre...” Etc.  De onde veio bem o sabia. “...Vós sois de baixo, eu sou de cima; vós sois deste mundo, eu não sou deste mundo.” Jo 8; 23  Para onde ia, também; “E agora vou para aquele que me enviou; nenhum de vós me pergunta: Para onde vais?” Jo 16; 5

Seu foco não era ser, origem ou destino; antes, alvo, missão. “...para que eu... pregue... para isso vim.” Conosco deveria se passar cuidado semelhante. Invés do quem, de onde, para onde? Deveríamos cogitar o por quê? Por que viemos à vida? Qual nosso alvo? Temos uma missão?  

O Gênesis relata o primeiro homem “um pouco menor que os anjos”, coroado de glória e constituído como regente terreno de toda criação, em submissão ao Criador, claro! Assim, gerenciar a empresa Divina e manter-se em comunhão era o fim idealizado a princípio.

Enquanto a comunhão era preservada, o próprio Deus vinha ao encontro da criatura ter com ela. Entretanto, quando a serpente apresentou um “Plano B”,  o encontro com o Santo já não foi pacífico, tampouco, desejado; antes, Adão se escondeu com medo. 

Vemos assim, que, a causa primeira do medo é a certeza íntima que estamos fora do propósito para o qual fomos criados. Às vezes, razões estritamente internas ganham projeção; assombram como se fossem ameaças reais e circunstantes. “  Os ímpios fogem sem que haja ninguém a persegui-los; mas os justos são ousados como um leão.” Prov; 28; 1

Judas, por exemplo, depois que traiu ao Senhor fugiu e foi se enforcar; sem ninguém a persegui-lo, exceto, pesos internos da consciência culpada. O mesmo pensador dissera: “O homem carregado do sangue de qualquer pessoa fugirá até à cova; ninguém o detenha.” Prov 28; 17  

Assim, a aceitação da perversão do inimigo acabou fazendo necessário o plano B de Deus. Uma vez perdida possibilidade do fim primeiro; administração da criação em comunhão com o Criador, Deus deixou de buscar proximidade com o homem como antes, pois, a presença do pecado estragava tudo. 

Para evitar o distanciamento e o medo, teve que nos buscar despido de Sua Glória, esvaziado na forma humana, Cristo. Assim, vindo Ele como se frágil, usaram o “argumento” da força para livrarem-se de seus medos, uma vez que recusavam a se livrar do pecado. 

Tanto quanto poderia vir ao nosso encontro, o Altíssimo veio em Jesus Cristo. A outra metade da caminhada para reconciliação cabe a nós. 

Discursando aos gregos, Paulo apresentou já o plano B, como se fosse A; afinal, após a queda, foi o que restou. Disse: “E de um só sangue fez toda a geração dos homens, para habitar sobre toda a face da terra, determinando os tempos já dantes ordenados, e os limites da sua habitação; para que buscassem ao Senhor, se porventura, tateando, o pudessem achar; ainda que não está longe de cada um de nós;” Atos 17; 26 e 27  

Assim como o Salvador tomava decisões baseadas em Sua missão, “para isso vim”, o mesmo deveria se dar conosco. Se, sabemos que viemos à vida num cenário de inimizade com o Eterno, para buscar reconciliação mediante Cristo, demos nessa direção os passos necessários. 

Sabemos que viemos de Deus; somos feitura Sua; quem somos, gostando ou não, ímpios, pecadores privados da graça de Deus; para onde vamos depende de nossa resposta objetiva ao porquê viemos?   

Afinal, todos os bens criados estão disponíveis às criaturas de Deus, o que, eventualmente as priva são seu males, ( pecados ). Qualquer conquista, por pomposa que seja, se obtida divorciada de Deus, no fundo, é obra morta, sem valor. 

Enquanto não renovarmos nossas mentes entendendo quais os verdadeiros bens, nos cansaremos numa busca inútil, privados do único bem que em última análise, contará; a vida. Vamos, pois, ao encontro do que regenera! Para isso viemos.

Excesso de bagagem

“E a todo o homem, a quem Deus deu riquezas, bens, e lhe deu poder para delas comer e tomar a sua porção, gozar do seu trabalho, isto é dom de Deus.” “Um homem a quem Deus deu riquezas, bens e honra, e nada lhe falta de tudo quanto  deseja, e Deus não lhe dá poder para daí comer, antes o estranho lho come; também isto é vaidade e má enfermidade.” Ecl 5; 19 e 6; 2
 
Salomão expõe duas situações semelhantes;  pessoas abastadas. Porém, com predicados diferentes. Uma pode usufruir suas posses, outra, não. Ora, se o direito à propriedade é sagrado em qualquer regime democrático, por que alguém não pode usufruir o que possui? 

Acontece que essa restrição não reside nas leis humanas, antes, na alma de tal “rico”. Para o que pode, o dinheiro é um meio; para o outro, um fim. Aquele, do que possui faz sua vida regalada; esse, do que ainda não tem, o alvo de sua cobiça.

Assim foi com Acabe, por exemplo; mesmo com as regalias do palácio real, sofria por não ter a vinha de Nabote. A megera rainha Jezabel maquinou como possuí-la a preço de fraude e sangue; isso lhe custou a vida.

Então, quando Deus “dá poder” para usufruir devemos entender com isso uma alma iluminada quanto ao papel dos bens e um coração liberal, altruísta. “Melhor é a vista dos olhos do que o vaguear da cobiça; também isto é vaidade e aflição de espírito.” 6; 9
  
Muitos católicos que se dão às peregrinação como a de Santiago de Compostela, na Espanha, por exemplo, dizem que o primeiro aprendizado é que devem descartar tudo o que for supérfluo para que a bagagem seja um socorro essencial, não, um peso.

Se sabemos que a vida terrena é mera peregrinação, posto que mais extensa, por que nos sobrecarregarmos de bagagens mui pesadas que não poderemos levar além? “Doce é o sono do trabalhador, quer coma pouco quer muito; mas a fartura do rico não o deixa dormir.” 5; 12   Salomão ensinando parte do “não poder” desse materialmente apegado.

Desgraçadamente, muitos sedizentes evangélicos ao invés de ensinar o vero sentido de nossa peregrinação, cujo alvo é ser sal e luz aos semelhantes, e ajuntar Tesouros no Céu para si, ensinam a  cobiça mundana, como se âncora e asas fossem sinônimos.

Ora, o Salvador denunciou  que do que o coração está pleno a boca fala. Lógico e natural que seja assim. Como apresentaria eu, a outrem, como desejável, aquilo que não for desejável a mim? Assim foi o pecado original. Satanás propôs como alvo ao primeiro casal algo que era seu sonho; ser como Deus.

Então, quando um pilantra qualquer acena ainda que pisoteando textos bíblicos, com a busca de mais bagagem, obscenamente expõe seu avarento coração; e sua mensagem só ecoa noutro igual. Assim, tais igrejas vivem sua “simbiose”; mercenário e incauto completam-se, como otário e vigarista.

Claro que em casos de privação extrema os bens são a primeira “oração” que devemos fazer em socorro de um necessitado qualquer, não se trata de omitir o óbvio. A ideia é uma profilaxia para evitar que a mosca dourada da cobiça nos possa inocular seu vírus. “Quem amar o dinheiro jamais dele se fartará; e quem amar a abundância nunca se fartará da renda; também isto é vaidade.” 5; 10
 
Não alude o pensador aos bens em si, antes, a um sentimento deslocado que faz amar coisas, bens, quando deveria fazê-lo em relação a pessoas. Paulo amplia: “Porque o amor ao dinheiro é a raiz de toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e  transpassaram a si mesmos com muitas dores.” I Tim 6; 10

O livro de Atos, aliás, traz o exemplo de Ananias e Safira que, por amor ao dinheiro mentiram solenemente perante Deus, e isso lhes custou mais que dores, mas, a vida.

Conheço pessoas de bem poucos bens que vivem felizes; e outras de muitas posses, que sofrem; todos conhecem! Certo que é saudável certa emulação ao vermos a prosperidade de nossos semelhantes, que nos faz trabalharmos mais em busca de melhorias de nossas condições de vida. Entretanto, é insano e destrutivo dar asas à cobiça desenfreada, pois, além de não apreciarmos devidamente o que temos, podemos incorrer em ilícitos almejando o que sequer carecemos.

“Afasta de mim a vaidade e a palavra mentirosa; não me dês nem a pobreza nem a riqueza; mantém-me do pão da minha porção de costume; para que, porventura, estando farto não te negue, … ou que, empobrecendo, não venha a furtar, e tome o nome de Deus em vão.” Prov 30; 8 e 9

domingo, 21 de setembro de 2014

Photoshop remove montanhas



Que faremos para executarmos as obras de Deus?” Jo 6; 28 

Uma das máscaras mais comuns na face humana é travestir nossos próprios anseios como se de Deus. Noutras palavras: laborar pelos próprios desejos, cobiças, e “santificar” isso atribuindo nossas deturpações Ao Santo.

Facilmente nos voluntariamos às coisas das quais pressupomos uma recompensa imediata. Essa febre se vê no relato de João que mostra o ápice do ministério de Jesus em termos de “aceitação”.

Multidões foram a Cafarnaum a Sua procura, e o interrogaram sobre como servir a Deus; que maravilha! Finalmente o Salvador conseguira tocar em seus corações! Não, infelizmente não era bem assim. 

A Parábola do Semeador ilustra bem que pouca semente da muita lançada cai em boa terra. Um dia antes Ele multiplicara o pão para a multidão. Eles foram atrás do Mestre em busca de mais, de modo que os exortou: “…me buscais, não pelos sinais que vistes, mas porque comestes do pão e vos saciastes.” V 26

Os ouvintes ainda tentaram uma fútil coação; quiçá emulação dizendo: “Moisés deu o pão do céu, que sinal operas tu?” v 30 e 31  Nem se preocuparam em disfarçar que não estavam atrás de pão como o Senhor acusara, antes, confirmaram isso com suas palavras. Não há dúvidas que se Ele tivesse vindo para trazer pães e peixes a desocupados seria um sucesso de público e crítica; mas, Seus alvos eram outros.

Depois de dizer que Ele é o pão vivo, o Senhor ensinou em quê consiste o “comer”. “…Eu sou o pão da vida; aquele que vem a mim não terá fome…” v 35  “Mas já vos disse que também vós me vistes, e contudo não credes.” V 36 O comer, no caso, é crer, o que implica obedecer às ultimas consequências, como ensina Paulo: “Ou não sabeis que todos quantos fomos batizados em Jesus Cristo fomos batizados na sua morte?” Rom 6; 3

Se alguém pretende ser Dele, pois, abdique da pretensão de gerir a própria vida e submeta-se totalmente à Sua Vontade. “…Se alguém quer vir após mim, negue a si mesmo, e tome cada dia a sua cruz, e siga-me.” Luc 9; 23  
Aliás, o mesmo Paulo escrevendo aos filipenses, reforça essa ideia em palavras bem claras; “De sorte que haja em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, que, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus, mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo…” Fp 2; 5 – 7

As multidões que hoje correm após mensagens que afirmam que Jesus continua multiplicando o pão e os peixes, ou seja, basta “sacrificar” e ter tudo; prosperidade, empregos, honras, são imensa maioria.

Seus gurus pegaram as partes “feias” do Evangelho e deram um trato no Photoshop, de modo que ficou lindo, a carne adora, uma vez que oferece o céu sem cruz.

Nunca prosperou tanto o engano como nos lábios dessa geração de safados, que despreza a cruz de Cristo e profana Seu santo Nome. “Porque muitos há, dos quais muitas vezes vos disse, e agora também digo, chorando, que são inimigos da cruz de Cristo, cujo fim é a perdição; cujo Deus é o ventre, e cuja glória é para confusão deles, que só pensam nas coisas terrenas.” Fp 3; 18 e 19

Seus templos estão cheios de gananciosos atraídos pela mensagem facilmente digerível que eles pregam. Fácil ao homem natural, ao espiritual soa obsceno. 

Tristemente somos uma geração que vê, tudo acaba em vídeo, pouco ouve, quase nada analisa. A imensa interação que os meios tecnológicos propiciam massifica; tolhe o indivíduo que acaba sumindo numa coisa amorfa, conduzida pelo fluxo comum em busca de aceitação.

Constroem seus majestosos templos, criam um “Deus” às suas imagens corruptas e mercantís, e apregoam como sendo o Senhor do universo.

Será que tinha isso em mente o traíra-mor, quando disse, “sereis como Deus”? Talvez nem ele suspeitasse quanto efeito essa mentira faria no seio da humanidade, deve estar se sentindo o cara.

O Evangelho genuíno continua centrado na Cruz de Cristo, seu fim ainda é salvar, e o meio, também persiste, arrependimento. O resto é só motim de pecadores profissionais, faltos de caráter que pecam sobre os púlpitos; não importa quanto sucesso alcancem, aliás, o único atrativo do pecado é que acena com certo prazer, omitindo as consequências, e pecado da pior espécie é o que suas mensagens contêm, profanação. 

A verdade não carece retoques, pois traz a beleza em si. “A obra de Deus é esta: Que creiais naquele que ele enviou.” Jo 6; 29
 
"O falso é tão vizinho do verdadeiro, que o sábio não deve aventurar-se num desfiladeiro tão perigoso."  Cícero

sábado, 20 de setembro de 2014

Andando sobre as águas

“E o enchi do Espírito de Deus, de sabedoria, e de entendimento, e de ciência em todo o lavor.” Ex 31; 3 “Porque a um pelo Espírito é dada a palavra da sabedoria; e a outro, pelo mesmo Espírito, a palavra da ciência;” I Cor 12; 8
Se a Bíblia apresenta ciência e sabedoria como coisas diversas forçoso nos é admitir que seja assim. Contudo, são como gêmeos que nascem unidos e é preciso uma delicada cirurgia para separar.


Mesmo o mais hábil “cirurgião” não ousaria algo tão nobre sem “tirar as sandálias” como Moisés. Embora sem jeito com o bisturi, ficar descalço eu posso, antes de me atrever.
A ciência está ao alcance de qualquer ser humano e pode ser galgada mediante estudo, pesquisa, experiências. É um contingente; como tal, pode ser aumentado a cada passo na busca da aquisição. Seu produto é amoral, tanto que pode servir para a medicina hightec ou para armas de destruição em massa, por exemplo. Assim, a árvore da ciência faz conhecer o bem e o mal.

A sabedoria, dado que gêmea da ciência, traz discrepâncias notáveis. Mais ou menos como certo filme que trouxe Arnold Schwarzenegger e Dany De Vitto como gêmeos. Posto que houvesse semelhança genética, o fenótipo, ( manifestação, aparência ) não tinha nada a ver.

A sabedoria é absoluta, não pode ser ampliada; o fato novo não a enriquece, antes, manifesta. Claro que o Sujeito de tal predicado só pode ser Deus. Assim, tem conteúdo moral, excelso, santo. “…a sabedoria que do alto vem é, primeiramente pura, depois pacífica, moderada, tratável, cheia de misericórdia e de bons frutos, sem parcialidade, e sem hipocrisia.” Tg 3; 17

Tiago opõe a Sabedoria a outra que chamou de, “Terrena, animal e diabólica”. Sua abrangência: Terrena, não toca as coisas do céu; seu espectro, animal; atua na alma, não no espírito humano; seu inspirador, quem propôs desobedecer a Deus e comer da árvore da ciência, o diabo. A sabedoria do alto atina a outra árvore que ficou meio esquecida no Jardim. A Árvore da Vida que mantém próximo ao Criador.

Não pode ser buscada noutra fonte, senão Nele; como fez o mais sábio dos homens, Salomão. “Eis que fiz segundo as tuas palavras; eis que te dei um coração tão sábio e entendido, que antes de ti igual não houve, e depois de ti igual não se levantará.” I Rs 3; 12

João ilustrou as multidões como águas, no Apocalipse. De carona nisso podemos dizer que, a sabedoria Divina personificada, Jesus Cristo, anda sobre as águas. “E dizia-lhes: Vós sois de baixo, eu sou de cima; vós sois deste mundo, eu não sou deste mundo. Por isso vos disse que morrereis em vossos pecados, porque se não crerdes que eu sou, morrereis em vossos pecados.” Jo 8; 23 e 24

Notemos que o upgrade proposto não é mediante a ciência, mas, a fé. “Se não crerdes…morrereis…” A sabedoria não é posta como enriquecedora do portador, antes, como fonte de vida. “Porque a sabedoria serve de sombra, como de sombra serve o dinheiro; mas, a excelência da sabedoria é que ela dá vida ao seu possuidor.” Ecl 7; 12

O existenciário no qual estamos inseridos demanda respostas que fogem em muito aos domínios da ciência; aí, os que refratários à fé em Deus criam fés alternativas e nomeiam de teorias. Quanto à fé proposta no Senhor chamam-na de cega, pois, lhes soa melhor isso que admitir que a ciência é limitada.

Não se entenda com isso uma eventual aversão à ciência, como se tal fosse o intento desse breve ensaio. O progresso da ciência também pode ser tributário a certos dons de Deus como versam os textos introdutórios. 


Mas, como o vínculo ao Divino não é necessário em seus domínios, o mau uso do conhecimento dá azo a coisas diversas que embora ditas científicas não passam de simulacros, que Paulo aconselhou a evitar. “Ó Timóteo, guarda o depósito que te foi confiado, tendo horror aos clamores vãos e profanos e às oposições da falsamente chamada ciência,” I Tim 6; 20 A classificada como falsa, pois, não se atém ao seu objeto, mas, ousa além, fazendo oposição à fé.
Em suma, onde os ateus classificam a fé como cega encontram os limites de sua própria visão. Afinal, caminhar sobre as águas requer certa ousadia incomum, como teve por alguns instantes, Pedro. Ele só se atreveu a tanto porque viu o Mestre fazendo e tentou imitar.

Como quem fecha a porta à fé não “vê” ao Senhor, fica sem parâmetro. Náufragos na ilha da incredulidade, os ateus até fazem suas rústicas jangadas teóricas no mar da existência; mas, os ventos nunca lhes são favoráveis.

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

A fraude dos debates políticos




Embora os medos, adulto e infantil cotejados na frase do filósofo pareçam antagônicos, são facetas do mesmo drama. Uma criança teme o escuro por sentir-se sozinha, desprotegida; depende da informação visual sua segurança. Um adulto teme à luz, pois, essa também o põe inseguro, dado que rasga a máscara do teatro comum que encena. 

O “escuro” de sua dissimulação que o protege. A criança quer companhia, cumplicidade; o adulto também. Aquela depende de ver; esse, de não ser visto como realmente é. 

A visão que conta, em última análise, ao curso do tempo prescinde dos olhos; abriga-se nos domínios do entendimento, compreensão. Daí se diz que “O pior cego é o que não quer ver”. Noutras palavras, o que voluntariamente priva-se do que lhe está ao alcance, por temer às consequências da luz. 

Cristo acusou seus coevos de uma fuga dessas. E a condenação é esta: Que a luz veio ao mundo, os homens amaram mais as trevas do que a luz, porque as suas obras eram más. Porque todo aquele que faz o mal odeia a luz, não vem para a luz, para que as suas obras não sejam reprovadas.” Jo 3; 19 e 20 

Assim como a solidão de um infante seria sentir-se isolado em ambiente espacial, a solidão adulta se dá do mesmo modo em “ambiente” moral, espiritual. 

Essas inquietações “luminosas” me assaltam nesse tempo, dado que, está em curso a propaganda eleitoral,  eventualmente, se promovem debates; e recuso terminantemente assistir tanto aquela, quanto esses. 

Não sei se um anjo, capetinha, ou, alter ego me acusou de evitar à luz, de fugir ao conhecimento por recusar ouvir o que os postulantes têm a dizer. Assim, como desconheço quem é o que me acusa, dirijo minha diatribe ao que servir o chapéu.

Primeiro: Não acho que uma pessoa vale pelo que diz; antes, pelo que é. O seu ser demonstra-se mediante ações, não, palavras. Como 99% dos postulantes já são pessoas públicas, sei o que fizeram;  isso me vale muito mais que o que dizem. 

Segundo: Um debate demonstra apenas que se dá melhor na retórica, no uso das palavras. Quem é mais hábil tanto em urdir, quanto, evadir-se a uma saia justa. Não há concessões à verdade; antes, erística pura e simples, com fito de puxar o tapete alheio. 

Quem for mais hábil nisso, a meu ver, é o mais velhaco; mais capaz de enganar ao povo, uma vez que triunfa publicamente a um oponente de nível semelhante. Desse modo, o “vencedor” num debate pode ser o pior para a sociedade. Capaz das mais grandiloquentes promessas e das mais esmeradas escusas para justificar-se por não tê-las cumprido, ao seu tempo. 

Um homem público, digo, um homem qualquer, vale por seu caráter, não,  sua lábia.  Se acreditasse deveras, que seu compromisso é com a luz, seja, a verdade, não me furtaria a ver tais coisas. 

Mas, quando “en passant” ouço Dilma apregoando sua “tolerância zero” à corrupção; Lula em ato de “desagravo” à Petrobrás, acho que minha criança perde o medo do escuro e rapidamente fujo dessa “luz”. 

Lembrei certo espanto manifestado por Isaías referente à Jerusalém de seus dias; “Como se fez prostituta a cidade fiel!” Como baixou o nível nossa sociedade na arte, esportes, política, costumes, valores... 

O humorista “Batoré” usava um bordão que me ocorre: “Pensa que é bonito ser feio?” Pois, é precisamente o que parece em nosso tempo. Quanto mais safado, corrupto, sem vergonha for, mais chances de triunfar nesse balaio de gatos onde conta o berro,  marketing, a cara de pau e os frutos somem nas brumas da mentira. 

Não sei o quê Ruy Barbosa viu quando escreveu sua célebre frase em que o triunfo das nulidades, mentira, maldade, ensejavam vergonha de ser honesto. Mas, é precisamente o cenário que assoma nesse tempo; talvez o mesmo daquele do Ruy, porém, no superlativo.

Pra meu gosto, aliás, sequer deveria existir propaganda política. Nos moldes em que é feita, além de custos elevadíssimos, alimento certo da corrupção, seu fim é enganar, não, iluminar. Bastaria que o próprio Tribunal Eleitoral desse número e currículo dos postulantes. A gente escolheria quem votar baseado nisso; em fatos, não, mirabolâncias utópicas e safadas mentiras. 

A divulgação sistemática de pesquisas também presta desserviço à democracia. Induz candidatos a mentirem mais se estão desagradando, e eleitores incautos a votarem em quem está melhor. 

A sociedade acaba traindo a si mesma refém de tais meios. "O povo não tem discernimento, apenas repete o que seus dirigentes julgam conveniente dizer-lhe." Platão