domingo, 24 de janeiro de 2021

O Cristão e a Ira


“Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra;” Mat 5; 5

Frequentemente se equaciona mansidão com fraqueza, como se fossem a mesma coisa mas, não é bem assim. Animais extremamente fortes, como os elefantes podem ser mansos. Mansidão, pois, trata de força sob controle, não a ausência dela.

Ninguém psicologicamente sadio ousaria pretender ser tão ou mais forte que Aquele que venceu o pecado, o mundo, o diabo e a morte. Contudo, Ele disse: “... aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração ...” Mat 11; 29

Em algum momento teremos que lidar com a ira. Somos advertidos pela Palavra que “... a ira do homem não opera a justiça de Deus.” Tg 1; 20 Portanto, parece uma postura que convém evitar.

Paulo diz: “Irai-vos e não pequeis; não se ponha o sol sobre a vossa ira.” Ef 4; 26 Na verdade ele estava parafraseando o salmista que dissera: “Perturbai-vos e não pequeis; falai com o vosso coração sobre a vossa cama e calai-vos.” Sal 4; 4

Então, temos nos textos sagrados uma concessão para até, nos irarmos, sem todavia, em cima disso cometermos pecado.

Na verdade, apesar de ser alistada nos “pecados capitais” pelo catolicismo, a ira em si, nem mesmo pecado é. Só um absoluto pusilânime pode contemplar injustiças, covardias, obscenidades, sem um quê de irritação, sem certa dose de ira, mal estar.

Ló em Sodoma provou muito disso; “(Porque este justo, habitando entre eles, afligia todos os dias a sua alma justa, vendo e ouvindo sobre as suas obras injustas); II Ped 2; 8

Jesus quando encontrou o comércio usurpando o lugar da adoração ao Senhor, em Seu zelo não conteve a ira; “Tendo feito um azorrague de cordéis, lançou todos fora do templo, também os bois e ovelhas; e espalhou o dinheiro dos cambiadores e derribou as mesas;” Jo 2; 15
Aliás, se Ele vier passar em revista tudo que se faz em Seu Nome atualmente é considerável o número de “mesas” a virar.

Cheia está a fraseologia dos Evangelhos de expressões que denotam uma saudável ira; expressões como “vá e não peques mais”, “também não te condeno” e afins, podem ser ditas com voz amorosa, suave; contudo, “hipócritas, raça de víboras... sepulcros caiados... cegos condutores de cegos...” e outras tantas trazem necessariamente um componente emocional mais quente que a fala comum.

Alguns advogam uma “mansidão” full time como se todas as situações devessem receber o mesmo tratamento, como se fôssemos robôs programados, não seres humanos suscetíveis de sentimentos.

Paulo pensavam que as respostas deveriam ser específicas a cada situação; “A vossa palavra seja sempre agradável, temperada com sal, para que saibais como vos convém responder a cada um.” Col 4;6

Esse “temperar com sal” faz nossa fala agradável a Deus que ama à verdade; aos humanos nem sempre.

Alguns, mercê de uma má interpretação do ensino que nossa luta não é contra carne e sangue, acham que não devemos polemizar, nem criticar aos “irmãos” que distorcem as Escrituras.

Ora, no mesmo texto que fala isso, manda os servos de Deus cingirem-se com a verdade, que não é outra coisa, senão, além de serem verdadeiros no agir denunciarem a mentira ao ministrar.

A couraça da justiça demanda não cometer injustiça, nem concordar com quem comete; assim as demais “armas”.

A luta por Cristo contra poderes espirituais opostos envolve participação humana, de ambos os lados. “Não é maravilha, porque o próprio Satanás se transfigura em anjo de luz. Não é muito que seus ministros se transfigurem em ministros da justiça; o fim dos quais será conforme suas obras.” II Cor 11; 14 e 15

Como assistir ao obsceno desempenho desses ministros sem uma saudável dose de ira? Até Deus a sente. “Deus é juiz justo, um Deus que se ira todos os dias.” Sal 7; 11

Não estou advogando melindrosos, irritadiços por coisas pequenas, egoístas, banais; esses, ante uma correção qualquer, invés de se arrependerem, mudarem de rumo, derrubam o beiço como Caim; se isolam como se, vítimas de injustiças. Nesses, a cruz tem muito trabalho a realizar.

Agora tratando-se de cristãos maduros, a paz necessária é com Deus; a horizontal é desejável mas, mera possibilidade, nem sempre factível. “Se for possível, quanto estiver em vós, tende paz com todos os homens.” Rom 12; 18

De nossa vontade, pois, devemos laborar pela paz; mas, se o preço for condescender com a violência à doutrina, Às Escrituras, lembremos da advertência de Jeremias: “Maldito aquele que fizer a obra do Senhor fraudulosamente; maldito aquele que retém a sua espada do sangue.” Jr 48; 10

“Dá-me asco essa falsa humildade, que no fundo gera a omissão e acaba nivelando tudo a padrões baixíssimos.” Clécio Almeida

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