“O coração do entendido buscará o conhecimento; mas a boca dos tolos se apascentará de estultícia.” Prov 15;14
Algumas nuances nessa antítese dão o que pensar. Antes dos contrastes, temos um aspecto similar entre ambos. Cada um gosta do que possui, mesmo possuindo coisas tão diferentes. O primeiro é entendido; contudo, quer mais; busca o conhecimento. Sua experiência com o aprendizado, as transformações que ele opera lhe faz apreciá-lo; o segundo, mesmo não tendo quase nada, basta-se no que possui. Ora, o que um tolo tem de mais notório? estultícia, estupidez. Pois, dessa se apascenta, descansa satisfeito naquilo que “sabe”.
Cada um tem seu “paladar adquirido” e busca alimentar-se conforme. Estobeu ensinou: “O asno prefere palha ao ouro.”
Contudo, apesar de tamanha discrepância neles, para serem diferenciados entre si, é necessária a leitura de um terceiro, alguém que os contemple de fora, como fez Salomão.
Julgar a si mesmo não é tarefa fácil. “É bem mais difícil julgar a si mesmo que aos outros; se consegues fazer um bom julgamento de ti, és um verdadeiro sábio”. Saint-Exuperry.
O entendido quando julga-se, geralmente encontra os lapsos das coisas que lhe faltam; “Os melhores homens que conheci, viviam descontentes consigo mesmos...” disse Spurgeon. O tolo costuma ser “sábio aos próprios olhos”, sua ignorância o instiga a crer que sabe muito. “O caminho do insensato é reto aos próprios olhos, mas o que dá ouvidos aos conselhos é sábio.” Prov 12;15 Essa “certeza” o faz refratário a quase tudo o que vem de fora: “A repreensão penetra mais profundamente no prudente, que cem açoites no tolo.” Prov 17;10
O sábio em princípio, aquele que deseja saber, é como um cão ao contrário; o bicho late contra o desconhecido, e festeja com alegria, ao que já conhece; o aprendiz dedicado, tem sede do desconhecido e certo tédio do que já sabe.
Outro aspecto que difere nossos personagens, é a profundidade com que tratam seus patrimônios intelectuais. Para o entendido, essas coisas merecem um assento profundo; “O coração do entendido buscará...” Saber coisas assim é assunto para o coração.
Para o tolo, a coisa cola na fachada, não vai além dos lábios. “A boca dos tolos se apascentará...” Além de tratar conselhos com superficialidade, tipo copiar e colar alguma sentença, descansa nisso, como se, sua paz, seu bom porte na estrada da vida estivesse garantido apenas por saber repetir algo decorado.
Nos espantamos com “cristãos” evolucionistas, espíritas, ou citando Nietsche; embora sejam coisas contraditórias onde o saber molda o paladar, para a fachada, qualquer adesivo está valendo.
Ora as coisas que são absorvidas no coração, têm efeito sobre seu paciente, antes de tudo; pois, é aquele que aprende uma diretriz sábia, medita sobre ela, e se deixa moldar pela mesma. Assim, aprender dessa forma é uma prerrogativa do que é entendido.
As coisas meramente nos lábios, para ser usadas como pedras contra desafetos não carecem de entendimento nenhum. Quantos mentecaptos gritaram impropérios tipo, “Nazista! Fascista”, sem sequer saber o que essas palavras significam? Quem precisa saber? Para usá-las como pedras, tanto faz se for pedra-ferro, arenito, basalto, pedra preciosa, até.
Tudo que um tolo anseia é manter-se distante de quem pensa diferente, sobretudo, quando esse sabe dizer em quê, e porque o faz. Meia dúzia de pedradas, “cuide da sua vida” e pronto! Assunto resolvido. “Os lábios do tolo se pascentam de estultícia.”
Invés do saudável crescimento mútuo no cotejo dos contraditórios, na interação dos que pensam diferente, vivemos a cultura do cancelamento, da validação da bolha predileta de cada um, em detrimento de tudo mais.
A própria Inteligência Artificial, com seus robôs programados e programadores, atua nesse sentido. Primeiro nos espiona para descobrir quais os nossos gostos, em termos do que consumimos nas redes sociais. Depois, direciona ao nosso encontro, basicamente as coisas escolhidas que, nosso histórico diz que gostamos. Desse modo, somos “protegidos” das visões que não apetecem, tolhidos da interação com o contraditório, acarinhados numa bolha viciosa, segundo a febre que mais vívida pulsar em nós.
O robô, pouco a pouco nos roubou a possibilidade de intercâmbio com os diferentes, tentando nos circunscrever à mediocridade do que já alcançamos. Se tivermos na “ponta da língua” uma sentença decorada para cada ocasião, por que perder tempo e coração, ansiando nos aprofundarmos mais nas coisas, haurindo delas essências capazes de mudar para melhor, o nosso viver?
Embora alguns tratem o conhecimento com menosprezo, como se fosse mera ferramenta para exibicionismo, no que tange à vida espiritual, ele é vital. “O Meu povo foi destruído porque lhe faltou o conhecimento...” Os 4;6
Não é errado termos boas coisas nos lábios; mas a excelência é darmos a elas, honroso assento nos nossos corações.
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