“Melhor é a criança pobre e sábia, que o rei velho e insensato, que não se deixa mais admoestar.” Ecl 4;13
Se cotejarmos uma criança com um ancião necessariamente veremos uma vida totalmente formada, e outra, em construção. Entretanto, essa, inda insipiente e incipiente, isto é; que não sabe e está começando, se diz que é sábia; melhor que o outro que já escalou o cume no pico do tempo. Por quê?
Como estamos diante de um provérbio antitético, (que confronta duas coisas opostas) e, a insensatez do rei velho deriva do fato de não se deixar mais corrigir; presumir que sabe de tudo; então, necessária é a conclusão que a “sabedoria” da criança é justo, isso; uma índole dócil ao ensino, à correção. Sua sabedoria ainda é em princípio, não, essência. Ou seja, não sabe das coisas, mas, sabe disso, e se dispõe a escutar quem sabe. Essa é melhor à medida que pode beber na fonte de Sophia, enquanto aquele, sequer identifica a necessidade disso.
Deveria ser uma coisa absolutamente natural, desejar aprender, contudo, nem sempre é assim. Em nossos dias, o poste mija no cachorro. A ignorância perdeu a modéstia há muito; em muitos casos, quem menos sabe é que mais fala, poluindo ao higiênico espaço do silêncio com o seu lixo passional, presumindo que repetir fonemas alheios equivalha, a saber.
As facilidades tecnológicas fazem vasto dano psicológico, à medida que, permitem a encenação de algo alugado, como se, fosse nossa propriedade.
Uma distinção é necessária a respeito do que abordamos para dirimir eventual ruído; conhecimento não é sinônimo de Sabedoria; não, da que abordamos aqui. Conhecimento é uma aquisição de meios externos; Sabedoria, o exercício de um dom interior a palpitar no espírito, na mente; que, como disse Plutarco, não é um vaso para ser cheio, mas, um fogo a ser aceso.
Além de intelectual tem seu “princípio ativo” espiritual; “O temor do Senhor é o princípio do conhecimento; os loucos desprezam a sabedoria e a instrução.” Prov 1;7 Em mais uma sentença antitética, temos em oposição aos sábios, não, os ignorantes, mas, os loucos.
E, como disse outrem, “reconhecemos um louco sempre que vemos, nunca, quando o somos”; essa incapacidade de auto-conhecimento das próprias limitações faz os “reis velhos” inferiores a outros que as identificam. Nossos erros, os alheios, as vicissitudes da vida, tudo nos ensina, se, tivermos em nós essa propensão ao aprendizado, senão, “mataremos aula” na escola da vida.
Engana-se quem pensa que, quem escreve algo assim esteja acima, vendo de fora as misérias alheias. Aí seria mais um “rei velho” apenas; também tropeço em minhas ignorâncias e careço desesperadamente aprender. O problema é encontrar as fontes onde isso é possível. Dado esse passo ditoso é só silenciar ante quem sabe, e buscar haurir o possível de quem tem para dar.
Entretanto, nosso sistema educacional está tão comprometido que, mesmo a difusão do conhecimento anda tropeçando no meio-fio da parcialidade ideológica. Que dizer da sabedoria, que normalmente viça adubada por idôneos referenciais e hígidos valores?
A grande bronca de Sócrates contra os sofistas, era que, fazendo eles, uso da retórica persuadiam seus ouvintes, invés, de iluminá-los; seu labor, dizia, produzia crença sem ciência. A sabedoria espiritual, invés da “fé cega” como dizem, estimula a conhecermos Aquele no qual cremos, e de onde vem a vera Sabedoria. “Então, conheçamos, e prossigamos em conhecer ao Senhor; Sua saída, como a alva, é certa; e Ele a nós virá como a chuva, como chuva serôdia que rega a terra.” Os 6;3
Em nenhuma área encontramos mais “reis velhos” que, quando abordamos temas espirituais; a maioria acha que a coisa é como futebol, ou, política que, cada qual tem sua opinião; todas são igualmente válidas. Não. Em se tratando de Palavra de Deus, tão somente Ela é válida nas diretrizes da vida. “... todo aquele que ouvir as palavras da profecia deste livro que, se alguém lhes acrescentar alguma coisa, Deus fará vir sobre ele as pragas que estão escritas neste livro; se, alguém tirar quaisquer palavras do livro desta profecia, Deus tirará sua parte do livro da vida...” Assim Deus encerra Sua carta de amor e justiça.
Os convertidos são desafiados a crucificar ao Rei Velho com suas inclinações; “Alimpai-vos, pois, do fermento velho, para que sejais nova massa...” I Cor 5;7 Pois, “... qualquer que não receber o Reino de Deus como menino, de maneira nenhuma entrará nele.” Mc 10;15
Salomão tido como o mais sábio dos homens, disse que os “sábios” humanos são apenas canais de Deus. “As palavras dos sábios são como aguilhões; como pregos bem fixados pelos mestres das assembleias, que, nos foram dadas pelo Único Pastor.” Ecl 12;11
“Para
que, segundo as riquezas da sua glória, vos conceda que sejais
corroborados com poder pelo seu Espírito no homem interior;” Ef 3; 16
Paulo
disse orar para que os efésios fossem corroborados, ou seja,
fortalecidos, confirmados pelo Espírito, no homem interior. Esse “homem
interior” merece algumas considerações.
O
notável filósofo, Sócrates, tentou explicar o ser humano usando a
seguinte figura: “dentro de um invólucro de pele, uma besta policéfala, (
monstro de várias cabeças ) e no alto, um homenzinho.” A besta –
explicou - tipifica a natureza indômita; cada cabeça um mau desejo, uma
inclinação perversa. O homenzinho, geralmente impotente, a razão. Na sua
concepção, o verdadeiro filósofo deveria “domar” a besta e se deixar
guiar pela instância superior.
Ora, o que fez a qualidade, originalmente superior, sucumbir ao
inferior foi precisamente a morte espiritual decorrente da queda. Ficou o
entendimento do bem, sem força para praticá-lo. Paulo também ilustra a
derrota do “homenzinho” ante a besta na luta de um bem intencionado sem o
auxilio de Cristo. “Porque bem sabemos que a lei é espiritual;
mas, eu sou carnal, vendido sob o pecado. Porque o que faço não aprovo;
o que quero isso não faço, mas o que aborreço isso faço. Se faço o que
não quero, consinto com a lei, que é boa. De maneira que agora já não
sou eu que faço isto, mas o pecado que habita em mim.” Rom 7; 14 a 17
A
reprovação interior pelos mal feitos são protestos inúteis da
consciência que, mesmo ainda apta para identificar pecados é impotente
para evitar, dada a supremacia dos desejos malsãos.
Quando
o Salvador ensinou a necessidade do novo nascimento mirava aí; a
restauração do homem interior, a vida espiritual. Nicodemos, por sua
vez, pensou no pacote inteiro com besta e tudo. “Disse-lhe
Nicodemos: Como pode um homem nascer, sendo velho? Pode, porventura,
tornar a entrar no ventre de sua mãe, e nascer? Jesus respondeu: Na
verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer da água e do
Espírito, não pode entrar no reino de Deus. O que é nascido da carne é
carne; o que é nascido do Espírito é espírito.” Jo 3; 4 a 6
O
homem natural, “carne” tende à decrepitude, pois, é refém do tempo; o
homem interior, de posse da vida eterna é instado a renovação,
crescimento, santificação. “Por isso não desfalecemos; ainda que
o nosso homem exterior se corrompa, o interior, contudo, se renova de
dia em dia.” II Cor 4; 16
Nas
coisas sócio-políticas da humanidade, geralmente, interior está numa
posição subalterna em relação aos governos, que ficam na Capital; sede
das decisões que afetam o país, estados; é a cabeça, ( cápita ) por
isso, Capital.
Contudo,
na “administração” da vida dos convertidos, o interior é capital. Digo;
vitais são as decisões que derivam do espírito recriado, em Sintonia
com o Espírito Santo. “Porque, qual
dos homens sabe as coisas do homem, senão o espírito do homem, que nele
está? Assim também ninguém sabe as coisas de Deus, senão o Espírito de
Deus. Nós não recebemos o espírito do mundo, mas, o Espírito que provém
de Deus, para que pudéssemos conhecer o que nos é dado gratuitamente por
Deus.” I Cor 2; 11 e 12
Esse fortalecimento do homem interior terá consequências. “Para
que Cristo habite pela fé nos vossos corações; a fim de, estando
arraigados e fundados em amor, poderdes perfeitamente compreender, com
todos os santos, qual seja a largura, o comprimento, a altura, a
profundidade, e conhecer o amor de Cristo, que excede todo o
entendimento, para que sejais cheios de toda a plenitude de Deus.” Ef 3;
17 a 19
Coloca
como raiz, fundamento do amor, sobre o qual, mais amor se edifica, em
busca da plenitude de Deus. Que diverso da ideia corrente de buscar
coisas de Deus, invés de Seu Ser! Por isso, após a renovação da vida,
precisamos “oxigenar” a mente, para entendermos o novo ser gerado em
nós, e seu fim. “…apresenteis os vossos corpos em
sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional.
E não sede conformados com este mundo, mas sede transformados pela
renovação do vosso entendimento, para que experimenteis qual seja a boa,
agradável, e perfeita vontade de Deus.” Rom 12; 1 e 2
Vemos
que agora, o “homenzinho”, razão, faz seu culto prendendo a besta, (
Sacrifício vivo ) não permitindo o extravasar nocivo de suas
inclinações. O simples aprisionar o mal é já seu juízo, a eficácia da
cruz. “Portanto,
agora nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus, que não
andam segundo a carne, mas segundo o Espírito.” Rom 8; 1