domingo, 3 de junho de 2018

Dormindo com o Inimigo

“Desde então muitos dos seus discípulos tornaram para trás; já não andavam com ele. Então disse Jesus aos doze: Quereis vós também retirar-vos?” Jo 6;66 e 67

Como seria se nós começássemos a pregar para uma multidão, que, pouco a pouco fosse se dispersando ao ouvir-nos? Quantas inquietações! Questionamentos. Onde foi que errei? O que houve com minha unção?

Pois, como vemos acima, isso aconteceu com O Senhor; falara para uma multidão que o buscara rasteiramente, por anseios do ventre, não, da alma; ao ouvir uma mensagem que julgou dura demais, começou a se dispersar. Todavia, invés dos medos que nos poderiam assaltar, O Salvador dirigiu-se aos mais chegados e perguntou: “Quereis vós também retirar-vos?”

Uma das mais sutis tentações do ministro do Evangelho é a do desempenho, da performance. Sem perceber que isso de “arrasar”, “rasgar a boca do balão”, “abafar”, é uma “moral” do mundo, cujo sucesso se mede por reles quantidade, a despeito da qualidade, tendemos a buscar essas coisas vãs.

Ocorre-me uma frase de Spurgeon: “Preocupe-se mais com a pessoa para quem olhas, que, com seu modo de olhar.” Noutras palavras: faça-se entender, invés de se fazer aplaudir. Muito fácil é ecoarmos Pedro, quando, ele disse que vale mais agradar a Deus que aos homens; entretanto, transportar isso para o teatro das ações, aí, não é tão fácil assim.

Nossa dupla natureza pós-conversão traz em seu bojo o “Publicano” que reconhece a própria indignidade, e o “Fariseu” religioso, cheio de si, presumindo que agrada a Deus apenas por sua “bondade”. Quando nos achamos merecedores de algo, ou, que nosso ministério é um fim em si, furtamos ao Senhor; saímos da honrosa posição de “amigos do Noivo”, para a baixa patifaria de traidores.

Infelizmente, é de nossa natureza frágil, a propensão pra se inclinar ao engano mortal, desde que, doce, invés, da sobriedade que protege, pois, nos parece amarga. Deus dissera antes do pecado que não incorressem nele, pois, morreriam; o inimigo fez uma “reengenharia” no projeto e disse que não morreriam; quem foi ouvido pelo primeiro casal?

Como o nome de um antigo filme, vivemos, “dormindo com o inimigo”, uma vez que nossa natureza permanece nos assediando mesmo depois de convertidos, e, “... a inclinação da carne é inimizade contra Deus, pois, não é sujeita à lei de Deus, nem, pode ser.” Rom 8;7

Nenhum pregador, por santo que seja logrará um purismo, tal, em sua mensagem, de modo que sua fala seja cem por cento, Palavra de Deus. Muitas palavras meramente humanas são necessárias, como vasos são necessários para acomodar produtos. Paulo usou essa figura, aliás: “Temos esse tesouro em vasos de Barro”.

Parece-me didático compararmos a um comprimido, onde, a maioria do volume é polvilho, ou, afim, e apenas uma minúscula parte é o princípio ativo. Assim, nossas mensagens, sejam escritas, ou, faladas; há muito de “polvilho” e, um tantinho da substância milagrosa que cura, a Palavra de Deus.

Entretanto, se, essa substância vital estiver presente, a eficácia esperada se verificará. O problema de eventuais ministros auto-idólatras viciados em desempenho, é que tenderão ao abandono da mesma, se, imaginarem que essa pode comprometer sua aprovação. Aí, seu “comprimido” por vistoso que seja não passará de um placebo, capaz de certo abalo psicológico eventual, mas, inútil no objetivo de levar salvação.

Não que seja problema, um ministro ser loquaz, versado na Palavra, retórica, na arte de convencer pessoas; isso devidamente utilizado é uma bênção; porém, acho que foi George Miller que disse: “Não há limites ao que Deus pode fazer através de um homem; desde que, ele não toque em Sua Glória.”

Por talentoso que seja carece reconhecer que a fonte disso é a Bendita Graça do Senhor. Sempre é oportuno lembrar que Satanás tornou-se o que é não por ser feio; mas, por achar que sua formosura já o fazia igual ao Todo Poderoso; “Elevou-se teu coração por causa da tua formosura, corrompeste tua sabedoria por causa do teu resplendor; por terra te lancei, diante dos reis te pus, para que olhem para ti.” Ez 28;17

O sucesso de um ministério tem a ver com, quanto ele se alinha à Vontade Divina, não, às pessoas que atrai. Deus avisou de antemão a Ezequiel que seu trabalho seria inútil, mesmo assim, o mandou ir; “... a casa de Israel não te quererá dar ouvidos, porque não querem dar ouvidos a mim...” Cap 3;7

Ele falou “às paredes”, mas, teve seu ministério aprovado.

Enfim, quem se importa com aplauso da Terra, usufrua-o plenamente; é esse o fruto do seu trabalho.

“Ter fé é acreditar naquilo que você não vê; a recompensa por essa fé é ver aquilo em que você acredita.” Santo Agostinho

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